A Simbologia do Muladhara Chakra

Os Yantras

Os chakras possuem um Yantra, isto é: uma imagem -com mais ou menos símbolos- que representa a mensagem e significado do mesmo. Eu considero essa imagem uma obra de arte, uma obra de arte não singular baseada nas crenças de linhagens de mestres dedicados a estudar e analisar a mente e a espiritualidade humana desde tempos imemoriais.

Utilizo a definição de não singular porque não poderíamos indicar um autor para tal ou qual obra representante de um chakra -yantra-, e ao mesmo tempo elas não são produto da produção em série; os símbolos são acordados, as mãos que os desenham podem mudar mas ainda assim preservam a singularidade de estar associados a um único objeto de representação: o chakra. Acho, sem ser mais do que amante do arte, que esse pode ser uma constante do arte religioso ou espiritual.

Os yantras, dependendo da quantidade de elementos simbólicos presentes neles, podem resultar mais ou menos anclados em deidades, por tanto mais ou menos associáveis a linhas religiosas.

Ainda assim, no caso dos yantras dos chakras, podemos fazer uma leitura muito profunda da significação que estas obras representam, indo além das “cascas” dos ritos e formas religiosas. Podemos ler valores “psicológicos” e a lição evolutiva de um chakra neles, sem necessariamente forçar uma barra nem fazer interpretações livres ou associativas.

O Muladhara Chakra

Mas vamos lá, hoje vamos entender melhor alguns dos símbolos apresentados no yantra do tantra. Uma das representações que maior quantidade de simbologia possui, por entanto que mais riqueza oferece para o intelecto.

Falo para o intelecto porque algumas práticas propõem meditações visuais focando ou imaginando o yantra para absorver a energia que a representação traz, e nesses casos eu acho mais práticas representações menos intelectualizadas, ou seja, menos carregadas.

Quando discutimos sobre o aspecto psicológico do Muladhara (mula: raíz, adhara: que dá suporte) falamos muito sobre a sua principal busca: a segurança, e a partir dela surgem dois arquétipos “a mãe terra” -quem está segure e oferece segurança- e “a vítima” -quem se sente insegure e demanda segurança-.

O primeiro aspecto ao qual vou chamar a atenção no yantra, é ao quadrado de fundo, ele representa o elemento fundamental do chakra: a terra. A terra age como ferramenta simbólica em milhares de tradições como a doadora de firmeza e segurança; nesse caso se diz que o elemento terra é composto pelos outros 4 elementos, ele possui aqueles em potência, e como veremos cada um terá um papel preponderante nos próximos chakras. 

As 4 pontas do quadrado como representantes dos 4 pontos cardinais e as 4 dimensões da terra -isso das 4 dimensões tem uma explicação muito complexa que ficará para outro momento, mas são: altura, largura, comprimento e ciclicidade-.

As 4 pétalas em volta do quadrado representam os vrittis -modulações mentais- fundamentais segundo o tantra: paramananda, sahajananda, virananda -o prazer no controle das paixões- e yogananda.

Se nos focamos no centro do desenho podemos apreciar um triângulo com um lingam (forma fálica) e uma serpente enrolada nele

O triângulo apontando abaixo quer dizer que esse chakra é regido pelo vayu -vento sutil, pode ler direção da circulação do prana- apana, aquele que estimula a excreção, expulsão de fluidos, parto. Ao mesmo tempo, o triângulo representa os Tripura (três mundos) da cognição (saber), Conação (agir) e Volição (sentir). É o triângulo também a representação da concentração do poder dos desejos sensuais. 

Em algum aspecto podemos ver como as energias de chakras superiores encontram-se em potência nos inferiores. O Muladhara, muitas vezes associado à animalidade, possui a semente da nossa capacidade de desenvolvimento espiritual e crescimento. Como falamos alguma vez no ciclo de aulas Resiliência, precisamos de paz para nos auto-conhecer, mas para ter paz precisamos de segurança.

O lingam, a forma fálica, ao interior do triângulo é tradicionalmente a representação do deus Shiva, aquele que “encarna” a energia da transformação e o caos que ela implica. Esse lingam em particular -porque sim, existem muitos tipos- é chamado Svayambu Lingam, o que quer dizer nascido de si próprio. 

Em volta dele uma serpente enrolada que, os e as conhecedoras saberão nomear: a famosa kundalini. E tenho uma notícia: ela não é uma serpente enrolada no seu quadril, ela é a representação de uma energia, aquela energia que te puxa pra frente no caminho espiritual. Aquela que faz você perceber as coisas como elas realmente são após um tempo de ter estado-se enganando, aquela que te faz sair da zona de conforto quando você mais precisa. Ela vai sair daquele estado dormente. Ela vai “crescer” se-elevando pelo que é chamado de nadis, canais de energia -lembre que isso tudo soa doido demais, e precisamos fazer um pequeno esforço para entender as metáforas-.

Os principais canais de energia são três e eles são representados pelas linhas que saem do lingam e atravessam todo o yantra até acima.

Nesses yantras mais “carregados” termos um portador -o portador da sílaba seminal, portador do mantra, da vibração ou, tal vez simplificando, dá lição daquele chakra-, este portador é um bicho, nesse caso o elefante Airavata, um elefante com 7 trombas.

Eu sinto que o fato dele ser chamado de portador quer dizer muito. Eu interpreto que o que ele simboliza talvez seja as lições que devemos aprender para evoluir através daquele chakra. Ao mesmo tempo temos uma deidade, talvez um símbolo do objetivo ou sinal de equilíbrio; uma shakti, uma deusa, que representa a energia, o estado ou disposição necessário para tirar aqueles aprendizados daí, e um regente, “alguém” que cuida durante esse período de aprendizado que a gente atravesse e aprenda o que deve aprender.

Airavata possui 7 trombas: representando as 7 cores do arcoiris, as 7 notas musicais, os 7 tecidos principais -ayurveda-, o domínio dos 7 tipos de desejos (segurança, sexo, longevidade, compartilhamento, conhecimento, autorealização, união), sabe, como um elefante domina a sua tromba nos deveriamos poder dominar os nossos desejos e utilizar a sua energía para nos ajudar a avançar e não para nos atrapalhar e deixar presses.

Um elefante também representa aquela ânsia animal pela sobrevivência, representa a força física mas uma força física carregada de humildade. Um bicho que poderia comer pessoas só come plantinhas…mesmo na grande força haver desenvolvido a humildade é um símbolo de espiritualidade.

A Shakti, talvez a energia que vai nos ajudar a evoluir através desse chakra, que abrirá as portas para o avanço da kundalini é a Dakini Shakti, uma forma atrativa de deusa, já que se acredita que para entrar no sushumna -nadi principal pela que soube a kundalini- tem que agradar ao porteiro. 

Ela é uma shakti serena. O seu olhar está focado, já que precisa de concentração para iniciar uma nova jornada. Ela possui 4 braços com:

  1. uma espada para cortar o medo e destruir a ignorância
  2. um escudo para proteger
  3. um crânio para cultivar a imparcialidade frente à morte -lembrar das lições associadas aos arquétipos desse chakra-
  4. um tridente, representante da tríada de deidades Brahma -criação-, Vishnu -manutenção- e Shiva -transformação-.

O regente é Ganesha, o deus elefante, um símbolo da fortuna e da força na hora de empreender novos caminhos. Ele possui também 4 mãos com símbolos:

  1. machadinho para controlar os desejos
  2. laço para simbolizar o evitar a servidão aos apegos materiais
  3. um mão no abhaya mudra, o mudra que inspira o destemor
  4. um laddu, um doce muito popular na índia que nesse caso representa a doçura do estado sattvico da mente -sattva representa o estado pleno e calmo-.

No meu ver, o principal mensagem do regente é que para iniciar essa trilha precisaremos conquistar o obstáculo da mente, tornar ela sattvica e forte frente aos desejos, os apegos e às aversões, Assim com a energia representada pela Shakti poderemos desabrochar as qualidades do Airavata e aos poucos começar a transparecer a presença representada pela deidade, o Brahma criança.

Ele possui 4 rostos pacíficos e doces, sattvicos, centrados, que representam:

  1. o eu físico
  2. o eu racional
  3. o eu emocional
  4. e o eu intuitivo

Eles também representam os 4 aspectos do Nada Yoga, os 4 planos do Som, já que se acredita que desde aqui nasce o som mais profundo: Nada.

Este Brahma também tem 4 braços carregados de simbologia:

  1. mão em abhaya mudra, representante do destemor,
  2. uma jarra com água ou elixir, essa força sem medos e plena de conhecimento é um elixir para a evolução espiritual,
  3. uma flor de lótus, representando o desabrochar da caminhada do yogi
  4. um pergaminho que representa o conhecimento espiritual, o autoconhecimento.

Evidentemente, por mais detalhado que tenha tentado ser, ainda fui carente de detalhes. Cores, disposições, localizações representam, os yantras são poli-significantes e isso indica a sua riqueza. 

Eu fiz algumas associações das significações ao estudo da perspectiva psicológica arquetípica do chakra, já que acho que é pertinente e coerente, mas muitos detalhes podem ter fugido ao meu olhar, é um conhecimento vivo que muda e se transforma interpretação a interpretação.

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